Como previram os filmes de ficção científica, a automação dominou o mundo e com isso os sistemas de controle tornaram-se fundamentais. Abordando esse tema, o jovem engenheiro Tiago Roux de Oliveira ganhou o Prêmio Capes 2011 na área de Engenharia Elétrica pela tese de doutorado Rastreamento para Sistemas Incertos Fortemente Não-Lineares com Direção de Controle Desconhecida, defendida em 2010 no Programa de Engenharia Elétrica da Coppe/UFRJ sob a orientação do professor Liu Hsu.
“Tudo que é automatizado requer um processo de controle e para isso é necessário um grande suporte da matemática. O prêmio foi uma surpresa porque trata de pesquisa básica, mas foi o resultado de um trabalho muito árduo, em que conseguimos mostrar a nossa contribuição no contexto internacional. A tese rendeu onze artigos publicados em revistas científicas nacionais/internacionais e continua a render frutos”, conta Tiago, que é carioca e tem 31 anos.
Projeta-se um controlador quando se quer automatizar um sistema, corrigi-lo ou adaptá-lo a uma mudança, mantendo seu bom desempenho. Para descrever matematicamente um sistema usam-se representações de todas as suas variáveis relevantes, mas há diferentes graus de complexidade nessa tarefa, já que existem modelos lineares, não-lineares e fortemente não-lineares.
Projetar um controlador utilizando todas as variáveis do sistema muitas vezes é economicamente inviável ou mesmo fisicamente impossível. Além disso, fenômenos instigantes podem ser encontrados quando se trata de sistemas não-lineares. Por exemplo, muitas vezes a relação de entrada e saída desses sistemas está adequada, mas seus estados internos podem estar escapando, ocasionando risco de danos ao sistema. Poder observar esse fenômeno a partir de sensores é fundamental.
A contribuição teórica do trabalho de Tiago foi a criação de algoritmos de controle com uma quantidade reduzida de informações, medindo apenas algumas variáveis do sistema. “Meu objetivo inicial era trabalhar com classes mais gerais de sistemas não-lineares. Mas à medida que trabalhávamos, fomos descobrindo aplicações para a teoria, o que foi a parte mais gratificante do trabalho”, conta Tiago.
Aplicações reais
Além de estender a classe de sistemas não-lineares que havia na literatura científica e que poderia ser controlada, Tiago formulou, ainda no campo teórico, um esquema para lidar com a direção de controle desconhecida (quando não se conhece o sinal da realimentação do sistema), relacionando o tema com a questão da otimização em tempo real ou controle extremal. O primeiro experimento, ainda a nível de simulação numérica, teve como resultado uma nova proposta de controlador para freios ABS.
Enquanto os freios tradicionais tentam zerar instantaneamente a velocidade angular das rodas, os freios ABS as travam utilizando a variável que corresponde à maior força de atrito, o que resulta em uma parada mais suave em menor tempo, sem deslizamentos. “Em nosso experimento na Coppe, conseguimos alcançar o ponto máximo da frenagem sem conhecer a velocidade angular ou o coeficiente de deslizamento da pista, apenas conhecendo a velocidade linear do carro”, conta Tiago.
A estratégia proposta pode também ser aplicada a outros problemas de otimização em que não se conhece a função custo. Por exemplo, no problema de navegação autônoma, em que o robô móvel deve rastrear fontes de sinais, ou ainda no âmbito de fontes de energias renováveis, no qual se deseja rastrear o ponto de máxima potência de um módulo fotovoltaico e assim melhor utilizá-lo.
A teoria da direção de controle desconhecida também foi aplicada em sistemas multivariáveis, com várias entradas e saídas. No caso, um sistema de controle chamado servovisão, que controla os movimentos de um robô através de uma câmera, e não pela informação medida nos motores das suas juntas. Até então a tecnologia existente permitia a servovisão com uma câmera alinhada com o robô. Na proposta de Tiago, tornou-se possível controlar o robô com a câmera em qualquer ângulo. Trata-se de uma excelente saída para ambientes inóspitos, como o fundo do mar e espaços com radioatividade, quando pode não haver como fazer ajustes na câmera.
“Precisamos de apoio para tirar essas ideias do papel. Sobre o freio ABS, conseguimos chegar a um esquema que se mostrou mais eficiente do que o tradicional e seria muito bom testar a aplicação desse algoritmo em nossos carros. Ideias nós temos, sabemos fazer. Só faltam o interesse das empresas e os incentivos”, diz Tiago.
Atualmente na Uerj, Tiago trabalha como professor da graduação e coordenador da linha de controle e automação do mestrado. Segundo ele, tem sido muito gratificante introduzir a linha de pesquisa com que trabalhou na Coppe na universidade onde se formou. “Mas continuo mantendo a colaboração com o prof. Liu. Aprendi com ele a trabalhar, a ter disciplina”, diz ele.
Sistemas de todo tipo
A modelagem matemática pode representar não apenas sistemas de engenharia, mas também sistemas econômicos, biológicos, e outros. Em todos eles, a complexidade de criação de controladores aumenta quando se trata de sistemas não-lineares ou fortemente não-lineares. Em certos casos, consegue-se linearizar a operação a partir de aproximações e fazer com que o controlador funcione de forma satisfatória. Mas há vezes em que certos fenômenos não permitem que se faça essa aproximação de maneira razoável. Então é preciso encarar esses sistemas complexos de maneira não-linear.
A modelagem da dinâmica do vírus da AIDS é um sistema biológico em que quaisquer tentativas de linearização são infrutíferas. Como a interação do vírus da AIDS com as células saudáveis é não-linear, é preciso usar uma técnica matemática não-linear para estudar, por exemplo, qual a dose e frequência que um medicamento deve ser usado para que a dinâmica se comporte de forma adequada.
A criptografia em circuitos de comunicação é outro exemplo. Num sistema de sincronização para circuitos mestre-escravo, ambos caóticos e não-lineares, em que pequenas mudanças em certas condições iniciais podem provocar fenômenos imprevisíveis, as variáveis de um são forçadas a seguir as variáveis do outro. Embora de forma externamente incompreensível, os dois sistemas se entendem, e podemos usar essa propriedade para transmitir informações de modo seguro.